sábado, 20 de setembro de 2014

Bohm e Khisnamurti

 Bohm na winkpédia

       Bohm se graduou em 1939 e passou a trabalhar com Oppenheimer em física teórica, primeiro no Instituto de Tecnologia da Califórnia, depois na Universidade da Califórnia, Berkeley. Durante a Segunda Guerra Mundial seu nome foi proposto por Oppenheimer para trabalhar com ele em Los Alamos na produção da primeira bomba atômica, mas recusado pelo exército devido a suas posições políticas. Ironicamente, seus cálculos para colisões de prótons e dêuterons se mostraram úteis para o projeto de construção da bomba, de modo que lhe foi vedado, por questões de segurança, o acesso a seus próprios dados, o que o impediu de escrever sua tese de doutorado. Para fins acadêmicos, Oppenheimer certificou que Bohm havia concluído a pesquisa. Posteriormente, Bohm trabalhou nos cálculos teóricos para o enriquecimento eletromagnético de urânio em Oak Ridge, para uso na bomba lançada em Hiroshima em 1945.
       Depois da guerra Bohm se tornou professor assistente na Universidade de Princeton, onde trabalhou com Albert Einstein. Em Maio de 1949, sob o macartismo, convocado para testemunhar contra Oppenheimer pelo Comitê de Atividades Anti-Americanas, recusou-se com base em seus direitos constitucionais. No ano seguinte foi acusado e preso e, embora absolvido em Maio de 1951, Princeton se recusou a renovar seu contrato, apesar dos pedidos de Einstein e outros colegas
       Suas contribuições para a física, principalmente na área da mecânica quântica e teoria da relatividade, foram significativas. Ainda como estudante de pós-graduação em Berkeley, descobriu o fenômeno eletrônico conhecido hoje como difusão de Bohm. Seu primeiro livro, Teoria quântica, publicado em 1951, foi considerado por Einstein a exposição mais clara que ele já havia visto sobre o assunto.
       Insatisfeito com a abordagem ortodoxa da física quântica descrita por ele neste mesmo livro, desenvolveu sua própria interpretação, uma teoria determinística da variável oculta não-local cujas predições concordam perfeitamente com as teorias quânticas, não-determinísticas. Seu trabalho foi um dos motivadores da desigualdade de Bell, cujas conseqüências ainda estão sendo investigadas.
       Em 1959 descobriu, com um aluno seu, o efeito Aharonov-Bohm, mostrando como um campo eletromagnético pode afetar uma região do espaço na qual esteja inserido, embora seu potencial vetorial não exista nela. Isto demonstrou pela primeira vez que o potencial vetorial, uma conveniência matemática, poderia ter efeitos físicos (quânticos) reais.
       Bohm também fez contribuições teóricas significativas ao desenvolvimento do modelo holonômico de funcionamento do cérebro. Em colaboração com Karl Pribram, neurocientista de Stanford, estabeleceu a fundamentação para a teoria de que o cérebro funciona de forma similar a um holograma, segundo princípios matemáticos e padrões de ondas. Estas formas de onda podem compor organizações semelhantes a hologramas, sugeriu Bohm, baseando este conceito na aplicação da análise de Fourier, uma forma de cálculo que transforma padrões complexos em ondas sinódicas componentes. O modelo holonômico do cérebro desenvolvido por Pribram e Bohm propõe um visão de mundo definida pela lente - semelhante ao efeito prismático texturizado de um raio solar refratado pela chuva no arco-íris - visão esta bastante diferente da abordagem "objetiva" convencional. Pribram acredita que se a psicologia quiser entender as condições que produzem o mundo das aparências, precisa se ater ao pensamento de físicos como Bohm.
       As visões científica e filosófica de Bohm são inseparáveis. Em 1959, lendo um livro do filósofo indiano Krishnamurti, percebeu o quanto suas próprias idéias sobre mecânica quântica se fundiam com as idéias filosóficas de Krishnamurti. Em seu livro Totalidade e Ordem Implícita, de 1980, e em Ciência, Ordem e Criatividade, Bohm expressou sua abordagem da filosofia e da física.
       Em seus últimos anos desenvolveu a técnica que se tornou conhecida como Diálogo de Bohm, na qual "objetivos coletivos" e "espaço livre" são os pré-requisitos mais importantes. Acreditava que, levados adiante em escala suficiente, tais Diálogos ajudariam a superar a fragmentação na sociedade.

Bohm e Krisnamurti


       Aqui David Bohm fala de sua ligação com Krisnamurti


       Meu primeiro contato com o trabalho de Krishnamurti foi em 1959 quando li o livro A PRIMEIRA E ÚLTIMA LIBERDADE. Meu interesse foi especialmente despertado pela profunda percepção da questão do observador e a coisa observada. Este assunto estivera de há muito intimamente ligado ao centro de meu próprio trabalho como físico teórico, fundamentalmente interessado no significado da teoria do quantum. Nesta teoria, pela primeira vez no desenvolvimento da física, a noção de que estes dois - o observador e coisa observada - não podem ser separados, foi apresentada como necessária à compreensão das leis fundamentais da matéria em geral. Por isso, e também porque o livro continha muitas outras percepções profundas, senti o quanto era urgente para mim conversar de modo direto e pessoalmente com Krishnamurti. E quando o encontrei pela primeira vez durante uma de suas visitas a Londres, fiquei impressionado com a sua capacidade de comunicação, o que se tornava possível devido à intensa energia com que ele escutava e por causa da isenção de barreiras e reservas auto-protetoras com as quais ele respondia ao que eu tinha a dizer. Como pessoa que trabalha com a ciência, senti-me completamente à vontade com este tipo de ação, a qual, em essência, é da mesma natureza daquela que encontrei nestes contatos com cientistas com os quais ocorreu uma íntima comunhão de mentes. E aqui penso especialmente em Einstein, que demonstrava ausência de barreiras e intensidade semelhantes durante um número de debates ocorridos entre ele e eu.
       Depois disso comecei a encontrar-me regularmente com Krishnamurti e a debater com ele, sempre por ocasião de suas vindas a Londres. Iniciamos uma relação que desde então se tornou mais estreita ao interessar-me pelas escolas, como por exemplo a de Brockwood Park na Inglaterra, instalada por iniciativa de Krishnamurti. Durante estes debates aprofundamo-nos em muitas questões de interesse para o meu trabalho científico. Investigamos a natureza do tempo e do espaço, como também a universal, tanto com relação à natureza externa como à da mente. Continuamos então a considerar a desordem geral e a confusão reinante na consciência da humanidade. Foi aqui que encontrei o que sinto ser a maior descoberta de Krishnamurti: o que ele seriamente propunha é que toda esta desordem - raiz da causa de tão vasto sofrimento e conflito que impede os seres humanos de trabalharem juntos adequadamente - tem sua origem no fato de ignorarmos a natureza geral do nosso próprio processo pensante. Em outras palavras, podemos dizer que não somos capazes de ver realmente o que está acontecendo quando estamos ocupados com a atividade do pensamento. Por meio de uma atenção muito profunda e da observação desta atividade da mente, Krishnamurti percebe diretamente ser o pensamento um processo material que prossegue no interior do homem, no cérebro e no sistema nervoso, como um todo.
       Ordinariamente tendemos a estar perceptivos sobretudo quanto ao conteúdo deste pensar, em vez de vermos como realmente ele funciona. É possível ilustrarmos este ponto considerando o que acontece quando estamos lendo um livro. Usualmente, estamos quase que inteiramente atentos ao significado do que está sendo lido. Entretanto, é possível aplicarmos nossa atenção ao próprio livro, à sua estrutura constituída de páginas que podem ser viradas, às palavras impressas, à tinta, à contextura do papel, etc. De modo semelhante, somos capazes de estar conscientes da estrutura real e da função do processo do pensar e não unicamente de seu conteúdo.
       Como é possível acontecer tal percepção? Segundo a proposição de Krishnamurti, isto requer aquilo a que ele denomina meditação. Ora, à palavra meditação tem sido dado um vasto alcance de diferentes e até contraditórios significados, muitos dos quais envolvendo tipos de misticismo um tanto superficiais. Krishnamurti tem em mente uma noção clara e definitiva quando usa esta palavra. Temos possibilidade de obter uma valiosa indicação deste significado se considerarmos a origem das palavras. As raízes das palavras, em combinação com os seus significados atuais geralmente aceitos, muitas vezes produzem surpreendentes percepções dos seus significados mais profundos. A palavra inglesa meditação baseia-se na raiz latina "med" que significa "medir". O significado atual da palavra é "refletir", "ponderar" (i.e., pesar ou medir) e "dar cuidadosa atenção". De modo semelhante, a palavra sânscrito para meditação, que é "dhyana", está intimamente ligada a "chyati", significando "refletir". Desse modo, meditar seria ponderar, refletir, enquanto se dá cuidadosa atenção ao que está de fato acontecendo.
       Talvez seja isso o que Krishnamurti quer dizer por "o começo da meditação". Isto é, damos toda atenção a tudo o que está acontecendo em combinação com a atividade real do pensamento, que é a fonte subjacente da desordem geral. Fazemos isso sem escolha, sem crítica, sem aceitação ou rejeição do que está ocorrendo. E tudo isto acontece juntamente com reflexões sobre o significado do que estamos aprendendo sobre a atividade da mente. (Talvez seja assim como se lêssemos um livro no qual as páginas estivessem fora de ordem e ficássemos intensamente conscientes desta desordem, em vez de estarmos "tentando encontrar sentido" no conteúdo confuso que aparece quando aceitamos as páginas como elas se apresentam).
       Krishnamurti tem observado que o próprio ato de meditação traz em si ordem à atividade do pensamento sem a intervenção da vontade, da escolha, da decisão, ou de qualquer outra ação do "pensador". Quando tal ordem surge, o barulho e o caos constituintes do fundo psicológico de nossa consciência morrem, e a mente torna-se geralmente silenciosa. (O pensamento surge somente quando necessário a alguma finalidade genuinamente válida e então ele pára até que se torne novamente necessário).
       Neste silêncio, segundo diz Krishnamurti, acontece algo novo e criativo, impossível de ser transmitido em palavras, porém de extraordinário significado para a totalidade da vida. Assim, ele não tenta comunicar isso verbalmente, e em vez disso sugere aos que estão interessados, que explorem a questão da meditação diretamente por si próprios, através da atenção real voltada para a natureza do pensamento.
       Sem tentar sondar este significado mais profundo da meditação, podemos dizer entretanto que a meditação, no sentido dado por Krishnamurti à palavra, é capaz de trazer ordem à nossa excessiva atividade mental e isto pode ser um fator chave capaz de pôr um fim ao sofrimento, à agonia, ao caos e à confusão, coisas que através dos tempos têm sido o destino da humanidade, e que de modo geral ainda continuam, sem perspectivas visíveis de uma mudança fundamental para o futuro previsível.
       O trabalho de Krishnamurti é impregnado daquilo a que se pode denominar a essência das investidas científicas, quando isto é considerado na sua mais alta e pura forma. Assim, ele começa partindo de um fato, isto é, a natureza dos nosso próprios processos pensantes. Este fato é estabelecido através de uma atenção total, envolvendo um cuidadoso ato de escutar o processo da consciência, observando-o diligentemente. Nesta atenção estamos aprendendo constantemente e desse aprender vem a percepção da natureza geral e excessiva do processo do pensamento. Esta percepção é então testada. Primeiramente vemos se ele se mantém unido de um modo racional, e então observamos se ele leva à ordem e à coerência sobre o que dele flui na vida como um todo.
       Krishnamurti constantemente enfatiza não ser ele de modo algum uma autoridade. Ele tem feito certas descobertas e está simplesmente fazendo o que pode a fim de torná-las acessíveis àqueles capazes de escutar. Seu trabalho não contém um corpo de doutrinas nem oferece técnicas ou métodos a fim de obter uma mente silenciosa. Ele não está tentando estabelecer nenhum sistema novo de crença religiosa. Em vez disso, cabe a cada ser humano ver se é possível descobrir por si só aquilo a que Krishnamurti dá o nome de atenção, e daí, continuar a fim de fazer novos descobrimentos próprios.
       É claro que uma introdução como esta pode quando muito mostrar como o trabalho de Krishnamurti foi visto por uma pessoa especial, um cientista como eu. A fim de entender por completo o que Krishnamurti quer transmitir, é necessário, naturalmente, continuar a ler o que ele de fato diz, com aquela natureza de atenção dirigida à totalidade de nossas próprias reações interiores e exteriores.

     David Bohm é muito conhecido como autor de quatro livros: Quantum Theory (1951), Causality and Chance in Modern Physics (1957), The Special Yheory of Relativity (1966) e Wholeness and the Implicate Order (1980). David Bohm é americano,  e foi professor no Birkbeck College durante mais de 20 anos, até 1983. Sua obra está ligada ao principal campo da teoria quântica, da relatividade e das questões filosóficas. Foi professor emérito da Universidade de Londres. Essa pequena biografia de Bohm consta do livro "A Eliminação do Tempo Psicológico" - Diálogo entre J. Krishnamurti e David Bohm - Cultrix.



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